- Dessa vez você parece diferente.
- É... você apareceu novamente em um momento de confusão. Mas hoje, não estou triste, embora eu não saiba exatamente como estou.
- Engraçado como as coisas são, não é mesmo?
- Nem me diga. Dessa vez eu achei que tudo ia se acertar rápido.
- E fácil, você também que dizer, não é?
- Sim. Estava tudo tão bem...
- Amigo, nada nessa vida é fácil. Ainda mais com você.
- É, mas pelo menos uma vez eu queria respirar aliviado.
- Mas você acabou de dizer que não está triste.
- Não estou mesmo. A própria confusão é confusa.
- Entendo.
- Queria que você realmente pudesse entender o que falo. Como das outras vezes que conversamos, você vai tentar me convencer de que estou errado.
- Curioso, dessa vez eu acho que você fez certo.
- Como assim? Faz anos que não sinto uma confusão dessa, e você me diz que estou certo?
- Sim. Justamente porque faz anos que você não sente isso. Você se lembra porque faz anos?
- Por causa do limite que havia imposto.
- Exatamente. E o que aconteceu enquanto você tinha esse limite?
- Eu me dei bem na vida. Estava bem, feliz, aliviado... Havia conseguido um bom emprego e reconhecimento. Havia conseguido coisas que muita gente quer...
- Mas lhe faltava algo, não é mesmo?
- Na verdade, nunca tinha percebido que faltava algo até então...
- Então falta algo, certo?
- Na verdade, no momento não acredito que falte. Mas eu descobri que dá para viver ainda melhor do que "bem".
- E o limite imposto?
- Dessa vez eu sequer pude notar a aproximação ao limite... Quando me dei conta, já havia atravessado.
- E você lamenta por isso?
- Sinceramente? Não. Pela primeira vez eu não lamento por isso. Pela primeira vez, eu não entendi nada do que aconteceu, mas estou feliz!
- Sabe por quê?
- Por que?
- Você finalmente sabe o que quer.
- Como assim?
- Você entendeu. Até então você seguia uma espécia de roteiro para sua vida. Perfeitinho, sem resuras ou desvios. Até então, mesmo com os dramas que aconteceram, você não teve nada fora do esperado pelo que você quisesse lutar. Você estava seguindo uma filosofia de "Eu não sei o que quero, mas eu sei que vou conseguir". E conseguiu. O bom emprego, a boa escolaridade, o reconhecimento e tudo mais. Você conquistou coisas que, na verdade, não eram exatamente o que você queria. Mas era o roteiro que sua vida estava seguindo. Lembra quando escreveu sobre a rotina?
- Lembro. E agora entendo o seu ponto de vista. Eu não sabia o que queria, mas sabia o que fazer para conseguir tudo o que eu "devia" ter.
- E agora? Como é a situação?
- Quase oposta. Eu sei exatamente o que quero, só não tenho certeza do que tenho que fazer para conseguir.
- Não tem mesmo?
- Certeza não, mas sei que farei o necessário. Já não tenho mais como voltar atrás, a linha já foi cruzada, e eu só a consigo ver desaparecer.
- Acho que a primeira vez que te vejo tão empolgado em tantos anos!
- E não é para estar?
- Mas e a notícia que você recebeu? As palavras que lhe foram ditas?
- Não importam. E sabe porque? Porque eu vou mostrar como elas, nesse caso, estão infundadas. Eu vou mostrar que, comigo, ela pode ser feliz, sem o medo de acreditar que será assim por muito tempo.
- Curioso sua mudança de humor enquanto fala.
- Curioso é que eu poderia estar totalmente desanimado, mas agora, pensando bem, não estou.
- Mas espera, sejamos racionais, embora geralmente só eu faça esse papel por aqui. Você acha mesmo que vai durar para sempre?
- Eu tenho que acreditar nisso. Não posso entrar nessa sem acreditar. E mesmo que, por alguma razão que eu sequer quero imaginar, der errado? Eu vou lamentar por algo que ainda não aconteceu? Pode dar certo, ou pode dar errado. Mas tudo é questão de se arriscar. Não quero mais viver com a sensação de "bem", e para ter o "extraordinário" é necessário arriscar!
- Exactament, mon ami.
- Não sabia que falava francês.
- Existem muitas coisas sobre mim, ou melhor, sobre você mesmo, que você não sabe e ainda precisa aprender. E você só irá aprender enquanto viver. Esqueça essa de impor limites. Viva intensamente, e conheça você como deve.
- Estranho. O que você falou soa como um adeus.
- Talvez um adeus, talvez um até mais. O importante é que agora eu posso voltar a ficar tranquilo em relação à você, então talvez não voltemos a conversar tão cedo.
- Entendo.
- Parece triste.
- Você sabe. Por mais chato que fosse, era um ótimo conselheiro. O melhor de todos.
- Isso apenas porque eu entendo você melhor que ninguém. Mas você não pode depender de mim eternamente, embora eu sempre estarei com você.
- Isso eu sei. Então essa é nossa despedida.
- Por enquanto, sim.
- Então é bom nos despedirmos como sempre, não é mesmo?
- Hahahahahahahaha. Sério, eu adoro você, abre o peito para dizer que quer arriscar, mas chega uma hora em que desiste disso. Mas enfim, faremos como queira. Boa Noite.
- Boa Noite, Eu.
Lorhien Wolpart
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